19.9.08

LIDOS OU RELIDOS EM 2008 (1)

“A Estrela dos Amantes”, Philippe Sollers, Teorema (2003)



foto: primeiro resultado da pesquisa no Google por “Philippe Sollers”


Comprado por 1 euro numa feira do livro, surge, muito a propósito, na colecção “outras estórias” da Teorema. Tempo suspenso entre Maud e o narrador, em diálogo cruzado com os “antigos”, sem pressas (“- Que fazemos? – diz Maud./- Nada. Esperamos.”). O espaço também não importa muito, porque os antigos também dizem “Que não há diferença alguma entre encontrar-se num templo ou à beira-rio, ou ainda numa aldeia, ou até numa cidade. Basta que o local seja agradável e permita que se guarde em nós a consciência de tudo.” Relembram-se cidades, perfumes, quarks, poetas (sobretudo orientais), explicando-se que não são citações, mas provas “de que existe uma única experiência fundamental através dos tempos, porque as palavras do poeta “vão em todos os rumos.” Diz-se ainda (p 73): “O universo canta, já que é vibração.” Evocação da teoria das cordas, essa tentativa de resolver a incompatibilidade entre a mecânica quântica e a relatividade generalizada, que nos diz que as partículas contêm filamentos dançantes que vibram e oscilam, de tal modo que as propriedades das partículas são reflexos das várias maneiras como uma corda pode vibrar (cf, “O Universo Elegante”, Brian Greene, Gradiva (2004, 2ª edição).

O público ainda não está preparado para escritas livres, que são aquelas que prescindem de lhe reproduzir a miséria que o ensina a respirar. Dificilmente um autor português publicaria um livro como “A Estrela dos Amantes” no mercado actual.

E já depois do último parágrafo, resolvi fazer uma pesquisinha no Google. Vou parar a um post de José Mário Silva no extinto blog de esquerda, que diz: “O mais recente romance de Philippe Sollers tem momentos de grande brilho e outros de absoluto impasse.” Este post remete para o artigo completo sobre o livro, que infelizmente parece já não estar disponível online. Fico assim sem saber de que forma é visto o tal “impasse”, desde logo estranhando que seja posto em contraponto ao “grande brilho”. Por mim, a palavra “impasse”, aplicada nestas circunstâncias, soa-me a concepção lacaniana de desejo como tentativa de preenchimento de uma falta. Acontece que não vejo a literatura como resolução de coisa nenhuma, mas como movimento natural da máquina desejante.



Rui Costa